Olá amigos, colegas e leitores!
Hoje eu vou falar sobre as vantagens e desvantagens de se fazer mangá no
Brasil. Claro que as desvantagens são bastante conhecidas de todos, e eu ando
numa vibe de positividade, por isso
vou tentar me ater às vantagens.^^
A primeira vantagem é, sem dúvida,
a melhor de todas! Somos livres pra criar. Podemos criar qualquer história, com
qualquer tema e qualquer gênero. Não precisamos ficar presos à moda do momento
e nem fazer o que uma editora quer que façamos.
Essa liberdade existe no Japão também, mas lá, por causa da correria que
é a produção, não dá pra pensar bem no roteiro. Então é preciso que o editor
cuide dessa parte junto com o artista. Aqui não, nós podemos ser mais
autênticos com nossas obras. O que pode
ser bom a primeira vista para muitos, pode ser ruim, pois às vezes um editor
pode distorcer a sua obra ou ideia original em nome do mercado e do público
alvo. Afinal, não existem apenas bons editores no Japão, existem os ruins. Aqui podemos ser realmente autênticos! Nosso
público alvo ainda está em processo de formação. Os brasileiros não dão muito
valor a isso, mas pense: se vc tivesse nascido lá no Japão, talvez seus
personagens jamais existissem! Seu tema escolhido podia ser podado por já estar
batido e ninguém veria a sua interpretação do tema. Ou pior, vc poderia ser
obrigado a explorar um tema da qual não queria explorar, simplesmente porque
quem manda é o editor e o mercado. Por
exemplo, o vampiro ficou na moda no Japão e uma autora foi obrigada a mudar
seus bruxinhos para vampirinhos. Tudo pra vender.
A outra vantagem é não ter
obrigação de desenhar com pressa. Todos sabem da rotina de um mangaká japonês.
Eles fazem 40 páginas por semana, pra revistas semanais. Apesar de ganhar por
página eles precisam contratar pessoas e mesmo assim a rotina é dura. Em muitos
casos, acredito que existam no Japão autores “impostores”, que são pessoas
capazes de desenhar mais ou menos, e camuflam isso usando o talento dos
assistentes. São eles que fazem os detalhes, cenários, roupas, retículas, etc. Quando
não, o artista não chega a ser autêntico, transformando um mangá numa fábrica
de coisas iguais, com capítulos fáceis de engolir, repetitivos e personagens
sem vida, pois não houve tempo de desenvolvê-lo bem. Um exemplo disso é o mangá
Sakura Gari de Yuu Watase. As primeiras 74 páginas ela fez sozinha, sem
assistentes, mas depois disso foi obrigada a contratá-los, pois cansa muito. Dá
pra notar a mudança sutil, mas eu estava adorando ver a Yuu pura, só ela!
Estava primoroso, depois se transformou num mangá normal. Ou seja, aqui no
Brasil, vemos o autor como ele é. Sua história, seu traço, sua artefinal, puro!
Mesmo que não seja um autor de nível alto ainda, vemos o que o autor pode
fazer. Podemos ver isso por um ângulo positivo, ao invés de ficar lamentando
não estar no Japão. Não digo pra ficarem tomando água de coco e esperando a
vida passar, e nem achar que os brasileiros devam aceitar sua preguiça de
melhorar, mas podemos e temos todo o tempo do mundo para “lamber” a página até
ficar boa na nossa concepção. Não precisa ter TOC e redesenhar um milhão de
vezes, mas podemos nos dedicar sem a pressão.
A outra vantagem é justamente
poder ter leitores verdadeiros, que realmente gostaram de seu trabalho nu e cru
e não um bando de otakus na febre do mangá, que vão ler e jogar seu mangá fora
depois que ler. Milhões curtem Dragon Ball, mas às vezes nem leram o mangá,
viram o anime ou até compraram os mangás, mas deixam juntar poeira na estante. São
mangás Ivete Sangalo, todos dizem que a amam, mas poucos compraram um CD original
dela... O sucesso é uma questão muito delicada. É medida em vendas, dinheiro e
status, nunca em qualidade da obra. Uma prova disso, são os autores daqui que
anunciam mangás e não lançam nunca, mas têm centenas de fãs curtindo a página
no face. Isso é só fama, não é obra em si. No que eles contribuem?
Não to querendo tapar o sol com a
peneira apenas pra fazer vc se conformar em não ter milhares de leitores, mas o
fato é que os grandes autores nem chegam a curtir a fama, não ligam pra números
de ranking. Nada no mundo me faz ser fã e curtir One Peace, por exemplo. Mesmo
com os 140 milhões de cópias que vende. Nem a fama do Dragon Ball me faz gostar
do traço do Akira. Em outras palavras, pra quem não gosta, de que serve a fama?
Então se apoiar em número de vendas pra dizer que o que vc curte é bom não vale
nada pro outro. Tem que ser bom pra vc. Isso vale pro autor também, fazer uma
obra só por grana e fama, pode não trazer realização pessoal no futuro. Claro
que se seu objetivo é grana e fama, vá em frente, não tá errado. Como eu disse,
somos livres.^^ Se conseguir aqui no Brasil me convida pra um café. hehehe
Eu andei pesquisando sobre
mangakás ocidentais nos EUA e na Europa e descobri que eles estão também
buscando novas alternativas de mostrar seus trabalhos. Por exemplo, a mangaká
Queenie, que é chinesa e publica nos EUA e já publicou em vários países,
incluindo aqui. Segundo ela, os editores americanos também têm o discursinho de
que mangá ocidental não vende. Eles não sabem como vender algo sem fandom. Ela foi
de publicação por editora para e-books que são vendidos no Amazon. Ela faturou
cerca de 140 mil dólares com o conjunto de nove obras. Agora ela está por conta
porque a editora fechou e o mercado pra ocidental tbém. Como o mercado de e-books é mais quente que
aqui, ela consegue ganhar com seus mangás, mas ainda não vive disso. O que me
parece ser a maior desvantagem que os mangakás fora do Japão enfrentam ainda. O
preconceito com as obras e o fator financeiro. Estamos em pleno processo de mudança no mundo
editorial. Toda mudança gera um desconforto e muita confusão. Foi o que
aconteceu com a indústria da música, que enfrentou o mp3. Agora a internet é uma
aliada para o sucesso de bandas que jamais seriam aceitas numa gravadora
antigamente, mas que agora geram milhões de reais sem precisar dividir o
dinheiro com as gravadoras.
No mundo artístico, é preciso ser
camaleão, ver espaço onde ninguém vê. Antes era muito difícil divulgar uma
banda sem gravadora, hoje é quase custo zero. Ou seja, no mundo do quadrinho
podemos ver a internet como uma aliada também. Todos sonham ainda em ter mangás
seus em bancas, mas será que isso já não está obsoleto? No Japão nem existem
bancas!
O custo de uma revista sempre inclui o valor que será pago nas
distribuidoras e livrarias. Será que sem isso não poderia custar 50% mais
barato? Será que ao invés de lutarem por cotas de publicação, não poderiam
lutar por um correio bem baratinho para revistas e livros comprados na
internet? Pense num quadrinho 50% mais barato e com correio irrisório. Ou seja,
temos que transformar nossas desvantagens em vantagens! E vendo o lado
positivo, talvez seja mais fácil achar soluções que ficar focado nos problemas.
Ainda vejo que muitos resistem a ideia
de publicação na internet e venda por ela também. O iniciante coloca seu mangá
na internet e já é cobrado pelos leitores de ir atrás de editora! Se ele não
consegue sofre até bullyng. Às vezes forçam o autor a fazer o impresso e ele
entra no catarse, sendo que não está pronto ainda pra assumir a responsabilidade
de trabalhar com impresso. Pode até desanimar se a empreitada não der certo.
Uns perdem o foco, tudo se transforma numa luta por monetizar. Sendo que antes
a ideia era mostrar a obra. Mas a pressão por sucesso imediato pode estragar um
bom projeto. Essa é uma das desvantagens do Brasil, a pressão por sucesso
imediato e monetização a qualquer custo. Vira uma corrida pelo ouro. Mas ganhar muito com mangá ainda é utópico e muitos correm atrás dessa utopia. A história em si e a obra ficam esquecidos nessa corrida.
E existem os dois lados dessa
pressão. Como todos sabem que ganhar dinheiro com HQ é difícil, alguns simplesmente
ficam inertes, engessados. Viram desenhistas que não desenham. Se o mercado
melhorar eles se mexem. O Brasil virou uma máquina moedora de artistas que não querem achar uma alternativa.
E por falar em alternativas, agora um autor tem como publicar sem precisar de editora, assim como as bandas andam fazendo. Se vc acha que já está bom, mas continua recebendo nãos de editoras, veja a matéria em vídeo abaixo.^^
http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/41117/Plataformas-digitais-ajudam-artistas-na-divulgacao-de-trabalhos.html
E por falar em alternativas, agora um autor tem como publicar sem precisar de editora, assim como as bandas andam fazendo. Se vc acha que já está bom, mas continua recebendo nãos de editoras, veja a matéria em vídeo abaixo.^^
http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/41117/Plataformas-digitais-ajudam-artistas-na-divulgacao-de-trabalhos.html
Em outras palavras, músicos
tocam, escritores escrevem e mangakás desenham! Essa é a vantagem de ser um
artista em qualquer lugar do mundo. É poder desenhar, mesmo com as
dificuldades.
A parte de autores “impostores”, me lembrou de Masami Kurumada, outor de CDZ. Li em algumas matérias, que os cenários, efeitos, fundos, e até as armaduras dos cavaleiros, são feitos pelos assistentes dele. Ele basicamente só desenha o rosto, e as poses dos personagens, que é justamente os elementos mais 'toscos' e repetitivos nos mangás dele, na minha opinião. rsrs
ResponderExcluirE bem que eu suspeitei que nos EUA, os mangás ocidentais também estariam passando por dificuldades... Até onde eu pude ver em minhas pesquisas, a Tokyopop era a única que realmente investia em mangás locais, mas ela faliu alguns anos atrás, e ela até retornou timidamente. Mas não sei se ela voltou a investir nessa área...
Recentemente, eu notei justamente, que cada vez mais autores, seja de livros, ou quadrinhos, vem publicando suas obras na Amazon, em formato e-book...
Bem, por hora, só não comentarei mais a respeito, porque já saem faíscas de minha cabeça, de tanto pensar nesse assunto. rsrs
De qualquer forma, ótimo texto, sensei! ^^
Uma vez vi um especial em vídeo com o Kurumada e ele tinha uma galera desenhando CDZ pra ele, e tudo que ele fazia era aprovar a arte. Não o vi desenhando nada! rsrs Ao contrário do CLAMP que vi produzindo páginas e pintando. Mas não se preocupe Alan, só estamos num processo de mudança, e vamos precisar nos adaptar ao novo jeito de se publicar no mundo.^^ Obrigada!
ResponderExcluirAdorei o post, ainda mais porque estava falando sobre isso justamente esses dias. A internet é nossa melhor aliada, e foi assim que consegui cada vez mais leitores, pq estava disponível pra leitura e quem gosta geralmente procura o impresso (uma forma de monetizar). Ainda é muito difícil viver disso, mas quem sabe um dia seja possível, é só as pessoas continuarem lutando e ainda acho que a internet é o meio, assim como vc sugeriu. As pessoas precisam começar a provar que é possível publicar e vender, com ou sem editora, é só cavar um espaço, um caminho.
ResponderExcluirQuanto aos leitores verdadeiros, falei sobre isso ontem. Eu adoro meus leitores pq eles não são obrigados a gostar doq eu faço, se eles gostam ou odeiam, é verdadeiro e sincero, e é isso que me move a continuar produzindo.
Isso mostra que vc é uma verdadeira artista, Mari-chan. Vc faz o mangá pras pessoas lerem e se entreterem e não por fama, fortuna e glória ilusórias. Talvez por isso mesmo que tenha alcançado uma publicação impressa. Eu tbém comecei assim, com o meu mangá disponível pra ler de graça, sem pretenção de vender qualquer coisa. Um mês depois eu tinha editora.^^ Foi surpreendentemente rápido.
ResponderExcluirTenho certeza que se vc tivesse nascido no Japão, seus personagens maravilhosos jamais teriam nascido! Sua visão de mangá seria uma visão nipônica e não sua, ocidental.^^
Falou tudo! Eu acho que um mangá deve ser feito com o objetivo de ser uma arte, e não apenas de ganhar dinheiro. e uma arte precisa ser original, precisa trazer o traço, o enredo e o roteiro do artista! Formar um grupo para criar mangá ate tudo bem, mas daí a deixar o trabalho todo dividido entre assistentes já é outro assunto... Outra coisa muito positiva é o tempo pra pensar direito e descançar que os mangakas brasileiros tem, sempre pensei que um mangaka japones mal deve ter tempo pra pensar no que vai fazer e tal...e iso gera um desgaste enorme no artista. Já vi vários mangas que começaram muito bem e depois de algum modo se tornaram muito repetitivos, apelaram a encher de clichês ou mesmo perderam totalmente a graça e acabaram por ficar incompletos.
ResponderExcluirConcordo, Débora! Dos milhares de títulos que saem no Japão, poucos são aqueles que podemos ver que têm uma "alma", a grande maioria é apenas histórias que não nos apetecem, não tem conteúdo algum.
ResponderExcluirMuito boas as suas ponderações sobre o mercado, Soni!!
ResponderExcluirO problema do povo aqui é ficar sonhando com Japão e esquecer que a realidade em volta é completamente outra, e isto nos rende vantagens também! Eu mesma já fui uma dessas inocentes: quando lá pelos meus 16 anos, me senti muito feliz por estar desenvolvendo gastrite, afinal, todos os meus desenhistas japoneses preferidos já passaram por isso, então eu só poderia estar no caminho certo! #sóquenão
E falando em gastrite, o lance do Kurumada hoje em dia só fazer 'o grosso' do trabalho tem a ver com isso: nos tempos da primeira febre dos Cavaleiros, ele se desgastou tanto bolando roteiros que quase morreu de gastrite. E sim, eu gosto do trabalho dele e sim, eu enxergo que o traço é tosco (antes que venha alguém me corrigir ou dizer que eu sou louca.). Sem mais...
Obrigada, Onçana! Pois é, imagine só se vc tem uma LER! Quem vai desenhar pra vc? Aqui no Brasil não tem como diblar as doenças inerentes a trabalhos com arte. Aí vc se ferra. O Kurumada ainda pode dar um jeito de continuar produtivo. Mas e nós? É melhor irmos com mais calma. Não precisamos copiar o lado ruim do jeito niponico de trabalhar. Afinal, não tem porque.
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